Heróis esquecidos II

(Publicado originalmente, sábado, 11 de julho de 2009)

Paulo Jorge Estrela

Capitão António Maria Teles Freire

[Campanha do Barué, Moçambique, 1917]

Medalha de prata de Valor Militar, letra “C”

Med-Valor-C-1-prataCondecorado com a Medalha Militar de prata da classe de Valor Militar, letra “C”, o Capitão de Infantaria, em serviço na Guarda Nacional Republicana, António Maria Teles Freire, porque sendo subalterno da 1ª Companhia Indígena de Infantaria da Companhia de Moçambique que, fazendo parte da Coluna do Gorongoza, operou em 1917 na última revolta do Barué, se distinguiu pela energia, serenidade, sangue frio e coragem com que soube comandar o seu pelotão, sempre na guarda avançada da coluna em todos os combates e recontros, nomeadamente nos combates do Rio Mutacuduri, em especial na travessia do vau de Xideu, em que, à força de estímulo e com o próprio exemplo, encorajou a sua fracção, com água pelo peito e sob fogo mortífero dos revoltosos até à difícil escalada da margem, que primeiro alcançou, organizando com rapidez o ataque à posição ocupada pelos revoltosos e secundando com a sua força e debandada das trincheiras. Este Oficial dirigiu com acerto alguns raids quando Comandante do Posto de Inhandar, dos quais se colheram óptimos resultados.
– Decreto de 12 de Fevereiro de 1921 (Ordem do Exército nº 3 / II Série / 1921)

Soldado Jacinto Mundau
[Incidente das Portas do Cerco, Macau, 1952]

– Medalha de cobre de Valor Militar
Condecorado com a Medalha de cobre de Valor Militar, a título póstumo, nos termos do § 2° do artigo 8° do Regulamento da Medalha Militar, de 28 de Maio de 1946, por satisfazer às condições expressas no § 1° do artigo 7° do mesmo regulamento, o Soldado Indí­gena de Moçambique, Jacinto Mundau, nº 50/A/335, da 2ª Companhia do Batalhão de Caçadores nº 1, da guarnição militar da Província de Macau, porque, quando se procedia ao encerramento da fronteira na tarde de 25 de Julho do ano findo, foi atingido grave­mente com tiros, disparados por militares chineses, que lhe causaram a morte, quando, desarmado, lutava corpo a corpo, a fim de libertar e trazer para território na­cional um seu camarada, que, apanhado de surpresa, era arrastado para território chinês, demonstrando valentia, coragem e dedicação patriótica.

– Portaria de 6 de Maio de 1953 (Ordem do Exército nº 9 / II Série / 1953)

2º Subchefe da PSP, Manuel Miguéns Maria
[Guerra do Ultramar, Moçambique, 1972]
– Medalha de cobre de Serviços Distintos, com palma
Med-SD-cobre-1Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro da Defesa Nacional, louvar, por proposta do Comandante-chefe das Forças Armadas de Mo­çambique, o 2º Subchefe nº 362/1701, Manuel Miguéns Maria, porque vem desempenhando as fun­ções de Chefe da Secção de Informações do Desta­camento Policial do Songo com muita dedicação, espírito de sacrifício e forma altamente eficiente.
Ajudando a estruturar e organizar a rede infor­mativa, em termos de poder responder às inúmeras solicitações apresentadas por uma guerra subversiva, soube o Subchefe Miguéns, no cumprimento das di­rectivas do comando e com o entusiasmo que possui, adensar e dilatar essa estrutura informativa com uma eficiência digna dos maiores encómios.
Elemento leal e dedicado, de um dinamismo fora do vulgar, vem a desenvolver uma intensa actividade informativa, para a qual tem dedicado muitas horas do seu justo descanso e corrido sérios riscos.
Conseguiu, através dessa rede e usando subterfúgios e expediente imaginosos, notícias preciosas e impor­tantes, que, transmitidas às entidades competentes e por estas exploradas, têm vindo a contribuir para a detenção de muitos elementos ligados ao inimigo e para a destruição das estruturas político-militares em diversas áreas.
Pelas qualidades apontadas, considero que o Sub­chefe Miguéns vem desempenhando um importante serviço de carácter militar, por forma a merecer louvor individual a ser publicado na Ordem do Exér­cito, considerando extraordinários e importantes os serviços prestados.
– Portaria de 31 de Maio de 1973 (Diário de Governo nº 135 / II Série / 1973)

Furriel Piloto-Aviador Augusto Krug

[Viriatos, Guerra Civil de Espanha, 1938]
– Medalha de prata de Valor Militar, com palma

Med-Valor-palma-1-prataFurriel Piloto-Aviador Augusto Krug, porque, tendo-se oferecido para servir na Missão Militar Portuguesa de Observação cm Espanha, denotou sempre grande ardor combativo, coragem, decisão e espírito de sacri­fício, especialmente demonstrado no difícil e arris­cado serviço de acompanhamento, em que mereceu os mais rasgados elogios dos seus chefes e camaradas espanhóis, e ainda porque em 14 de Agosto de 1938, tripulando o avião nº 5 da “Cadena”, que colaborava no ataque à Serra de Pandols, tendo o seu avião sido atingido com bala explosiva no aileron esquerdo e com os comandos de direcção avariados, com grande risco, sangue-frio e habilidade, em vez de se lançar em pára-quedas, como em casos semelhantes era cor­rente na guerra, conduziu o aparelho ao primeiro terreno onde pôde aterrar, conseguindo assim salv­á-lo, procedimento este que deu origem a merecidos louvores de entidades espanholas e a um telegrama em que o General Comandante do Exército do Ar en­carregou o Chefe da Aviação de Cooperação de trans­mitir as suas felicitações a este piloto pela sua bri­lhante actuação.

– Portarias de 18 e 22 de Maio de 1940 (Ordem do Exército nº 11, II Série, 1940)

 

Heróis esquecidos I

(Originally Posted by Paulo Jorge Estrela, June 2009)

Paulo Jorge Estrela

Queremos com esta série de posts, a que daremos o título de “Heróis esquecidos”, relembrar e homenagear alguns Portugueses que ao longo dos últimos cem anos da nossa História, quando enfrentaram momentos de grande perigo se viram obrigados a reagir e tiveram um comportamento digno de registo. Muitos deram a sua vida em nome de Portugal, e em comum, todos foram agraciados pelo Estado Português, pelo que, em geral, tornaremos público o texto do diploma legal que os agraciou.

A Condecoração, enquanto prémio público, concedida por acções meritórias não é só um dever do Estado (por intermédio das suas variadas instituições) mas é, igualmente, um poderoso exemplo para que outros concidadãos dêem o melhor de si, quer em valor como em empenho e talento.
Iremos dar prioridade a pequenos Teatros de Operações ou a pequenas situações de tensão e conflito ocorridas em variados pontos do Império. De igual forma, a ideia é relembrar aqueles que habitualmente ficam de fora dos grandes trabalhos dedicados à acção dos militares dos 3 Ramos das Forças Armadas, como tem acontecido com as campanhas da Guerra do Ultramar. Nestas circunstâncias temos, a título de exemplo, os Sipaios, os Polícias, os Guardas-fiscais, os civis que actuavam como guias e batedores (ou mesmo algumas senhoras), as tropas auxiliares e as forças de milícias e de 2ª linha.

Sipaio Joaquim Amona
[Guerra do Ultramar, Guiné, 1969]

– Louvor e Medalha da Cruz de Guerra de 1ª classe (a título póstumo)

Cruz-Guerra-pescoço-1ª-clManda o Governo da República Portuguesa, pelo Minis­tro da Defesa Nacional, louvar, por proposta do Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné, o Sipaio Joaquim Amona, da Administração do Posto de Binar, porque no ataque particularmente violento que o inimigo efectuou sobre esta localidade em 17 de Julho de 1969, ao tomar parte na reacção das nossas tropas, debaixo de nutrido fogo adversário, conduziu um grupo de caçadores nativos em perseguição do inimigo, de modo a obter uma reacção violenta que fez quebrar o ímpeto inicial da acção. Apesar do intenso fogo, o Sipaio Joaquim, reagindo pelo fogo e movimento, com risco de vida, conseguiu aproximar-se muito dos elementos inimigos, numa acção de coragem, sangue-frio e desprezo pelo perigo, incitando o seu grupo à reacção e conseguindo abater um elemento inimigo a pequena distância, de tal modo que a sua acção plena de decisão e serena energia conseguiu pôr em fuga os elementos inimigos que sobre si faziam fogo, não sem que antes lhe tivessem provocado ferimentos de que veio a falecer.
Para além das qualidades e virtudes evidenciadas nesta acção, que não foram mais do que a confirmação das mesmas já amplamente conhecidas, o Sipaio Joaquim, desde o inicio dos acontecimentos, sempre trabalhou com as nossas tropas, apesar da sua avançada idade, de molde a merecer sempre os mais rasgados elogios, respeito e consideração de quem teve a honra de o ter por colaborador.
Extremamente leal, de acrisolado patriotismo e dedicação pela causa que serviu até morrer, o Sipaio Joaquim soube sempre comportar- se de molde a merecer a consideração, respeito e a admiração pelas qualidades que a todo o momento evidenciava, quer em operações, quer no trato pessoal.
Dispondo em cada militar de um amigo desinteressado, mereceu sempre dos comandantes com quem trabalhou inúmeros louvores e elogios que não só devido às suas qualidades de combatente evoluído, experiente e experimentado, mas também devido às suas qualidades excepcionais de guia das nossas tropas, ainda há bem pouco tempo reconhecidas por um louvor que lhe foi concedido.
Dispunha ainda o Sipaio Joaquim, devido às suas qualidades humanas, de um prestígio difícil de igualar junto de todas as populações da área, o que foi também demonstrado nas cerimónias do seu funeral, que fizeram reunir à sua volta milhares de nativos.
Por tudo o que acima fica exposto, o Sipaio Joaquim Amona, para além da perda que representa, foi bem um exemplo de amor pátrio, dedicação pela causa que serviu de modo exemplar, e digno de ser realçado como personalidade invulgar e merecedor do maior respeito e admiração de todos nós, e elevado exemplo de qualidades e virtudes que nunca será de mais enaltecer.
– Portaria de 5 de Fevereiro de 1970 (Diário de Governo nº 37 / II Série / 1970)

Tenente miliciano Jean Marie Filiol de Raimond
[Ataques fronteiriços, Estado Português da Índia, 1957]

– Medalha de prata de Valor Militar, com palma (a título póstumo)

Med-Valor-prata-palmaManda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro da Defesa Nacional, e nos termos do ar­tigo 50° do Regulamento da Medalha Militar, de 28 de Maio de 1946, condecorar a título póstumo com a Medalha de prata de Valor Mi litar, com palma, o Tenente miliciano de Infantaria Jean Marie Filiol de Raimond, porque, uma vez chegado, na noite de 17 para 18 de Setembro de 1957, junto do Posto frontei­riço de Anconém, do distrito de Goa, onde se travava um duro combate havia já algumas horas, indiferente ao intenso fogo de armas automáticas e às granadas de mão constantemente lançadas pelos assaltantes, que procuravam dominar a guarnição portuguesa, tomou o comando de uma fracção da patrulha que acompanhara, a fim de, procurar envolver o inimigo por um dos flancos; e por tal maneira se conduziu, indife­rente ao perigo e debaixo do fogo do atacante, muito superior em número e na qualidade do armamento, que rapidamente contribuiu para que o agressor levantasse o cerco e se pusesse em fuga para o território donde tinha partido e onde, a coberto da fronteira, não podia mais ser perseguido.

Possuidor de rara coragem moral e grande espírito de decisão, procurando infiltrar-se à frente dos seus homens para atingir duramente o inimigo, só deixou de combater com a maior tenacidade quando, atingido mortalmente pelo fogo adver­sário, caiu inanimado, depois de ter incitado os seus subordinados ao cumprimento dos seus deveres para com a Pátria que tinha abraçado com o maior ardor desde a infância.
– Portaria de 10 de Dezembro de 1957 (Diário de Governo nº 251 / II Série / 1957)

Enfermeira Joana de Saúde Pires Tenório
[Guerra do Ultramar, Angola, 1961]

– Medalha de prata de Mérito Feminino – Pela Pátria

Med-Merito-Feminino
Considerando que Joana de Saúde Pires Tenório, Enfermeira nas minas do Mavoio, da Empresa do Cobre de Angola, exerceu notável acção em que muito contribuiu para manter o elevado moral do punhado de portugueses que tão nobre e valentemente asseguraram a defesa daquelas minas, posição chave nas faldas da Serra da Canda, concorrendo assim para a manutenção da soberania nacional naquela região; Considerando que em Março de  1961, quando da onda sanguinária do terrorismo avassalava a região do Mavoio, forçando a evacuação total de mulheres e crianças, ficou voluntariamente até que a região estivesse ocupada militarmente e pacificada, continuando a prestar a elementos do Exército a sua assistência técnica e moral;

Considerando ainda que, com risco da própria vida, demonstrou sempre, sobretudo nos momentos mais críticos, as suas extraordinárias qualidades de abnegação, heroísmo e sacrifício, a par de inexcedível calma, valentia e patriotismo, pelo que deve ser apontada como exemplo de portuguesa que nobremente serviu a Pátria:
Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro do Exército, condecorar com a Medalha de prata de Mérito Feminino – Pela Pátria, por se encontrar ao abrigo do nº 2 do artigo 2º, com referência ao artigo 3º do Decreto-Lei nº 44 566, de 12 de Setembro de 1962, a Enfermeira Joana de Saúde Pires Tenório.
– Portaria de 28 de Setembro de 1962 (Diário de Governo nº 255 / II Série / 1962)