Heróis esquecidos I

(Originally Posted by Paulo Jorge Estrela, June 2009)

Paulo Jorge Estrela

Queremos com esta série de posts, a que daremos o título de “Heróis esquecidos”, relembrar e homenagear alguns Portugueses que ao longo dos últimos cem anos da nossa História, quando enfrentaram momentos de grande perigo se viram obrigados a reagir e tiveram um comportamento digno de registo. Muitos deram a sua vida em nome de Portugal, e em comum, todos foram agraciados pelo Estado Português, pelo que, em geral, tornaremos público o texto do diploma legal que os agraciou.

A Condecoração, enquanto prémio público, concedida por acções meritórias não é só um dever do Estado (por intermédio das suas variadas instituições) mas é, igualmente, um poderoso exemplo para que outros concidadãos dêem o melhor de si, quer em valor como em empenho e talento.
Iremos dar prioridade a pequenos Teatros de Operações ou a pequenas situações de tensão e conflito ocorridas em variados pontos do Império. De igual forma, a ideia é relembrar aqueles que habitualmente ficam de fora dos grandes trabalhos dedicados à acção dos militares dos 3 Ramos das Forças Armadas, como tem acontecido com as campanhas da Guerra do Ultramar. Nestas circunstâncias temos, a título de exemplo, os Sipaios, os Polícias, os Guardas-fiscais, os civis que actuavam como guias e batedores (ou mesmo algumas senhoras), as tropas auxiliares e as forças de milícias e de 2ª linha.

Sipaio Joaquim Amona
[Guerra do Ultramar, Guiné, 1969]

– Louvor e Medalha da Cruz de Guerra de 1ª classe (a título póstumo)

Cruz-Guerra-pescoço-1ª-clManda o Governo da República Portuguesa, pelo Minis­tro da Defesa Nacional, louvar, por proposta do Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné, o Sipaio Joaquim Amona, da Administração do Posto de Binar, porque no ataque particularmente violento que o inimigo efectuou sobre esta localidade em 17 de Julho de 1969, ao tomar parte na reacção das nossas tropas, debaixo de nutrido fogo adversário, conduziu um grupo de caçadores nativos em perseguição do inimigo, de modo a obter uma reacção violenta que fez quebrar o ímpeto inicial da acção. Apesar do intenso fogo, o Sipaio Joaquim, reagindo pelo fogo e movimento, com risco de vida, conseguiu aproximar-se muito dos elementos inimigos, numa acção de coragem, sangue-frio e desprezo pelo perigo, incitando o seu grupo à reacção e conseguindo abater um elemento inimigo a pequena distância, de tal modo que a sua acção plena de decisão e serena energia conseguiu pôr em fuga os elementos inimigos que sobre si faziam fogo, não sem que antes lhe tivessem provocado ferimentos de que veio a falecer.
Para além das qualidades e virtudes evidenciadas nesta acção, que não foram mais do que a confirmação das mesmas já amplamente conhecidas, o Sipaio Joaquim, desde o inicio dos acontecimentos, sempre trabalhou com as nossas tropas, apesar da sua avançada idade, de molde a merecer sempre os mais rasgados elogios, respeito e consideração de quem teve a honra de o ter por colaborador.
Extremamente leal, de acrisolado patriotismo e dedicação pela causa que serviu até morrer, o Sipaio Joaquim soube sempre comportar- se de molde a merecer a consideração, respeito e a admiração pelas qualidades que a todo o momento evidenciava, quer em operações, quer no trato pessoal.
Dispondo em cada militar de um amigo desinteressado, mereceu sempre dos comandantes com quem trabalhou inúmeros louvores e elogios que não só devido às suas qualidades de combatente evoluído, experiente e experimentado, mas também devido às suas qualidades excepcionais de guia das nossas tropas, ainda há bem pouco tempo reconhecidas por um louvor que lhe foi concedido.
Dispunha ainda o Sipaio Joaquim, devido às suas qualidades humanas, de um prestígio difícil de igualar junto de todas as populações da área, o que foi também demonstrado nas cerimónias do seu funeral, que fizeram reunir à sua volta milhares de nativos.
Por tudo o que acima fica exposto, o Sipaio Joaquim Amona, para além da perda que representa, foi bem um exemplo de amor pátrio, dedicação pela causa que serviu de modo exemplar, e digno de ser realçado como personalidade invulgar e merecedor do maior respeito e admiração de todos nós, e elevado exemplo de qualidades e virtudes que nunca será de mais enaltecer.
– Portaria de 5 de Fevereiro de 1970 (Diário de Governo nº 37 / II Série / 1970)

Tenente miliciano Jean Marie Filiol de Raimond
[Ataques fronteiriços, Estado Português da Índia, 1957]

– Medalha de prata de Valor Militar, com palma (a título póstumo)

Med-Valor-prata-palmaManda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro da Defesa Nacional, e nos termos do ar­tigo 50° do Regulamento da Medalha Militar, de 28 de Maio de 1946, condecorar a título póstumo com a Medalha de prata de Valor Mi litar, com palma, o Tenente miliciano de Infantaria Jean Marie Filiol de Raimond, porque, uma vez chegado, na noite de 17 para 18 de Setembro de 1957, junto do Posto frontei­riço de Anconém, do distrito de Goa, onde se travava um duro combate havia já algumas horas, indiferente ao intenso fogo de armas automáticas e às granadas de mão constantemente lançadas pelos assaltantes, que procuravam dominar a guarnição portuguesa, tomou o comando de uma fracção da patrulha que acompanhara, a fim de, procurar envolver o inimigo por um dos flancos; e por tal maneira se conduziu, indife­rente ao perigo e debaixo do fogo do atacante, muito superior em número e na qualidade do armamento, que rapidamente contribuiu para que o agressor levantasse o cerco e se pusesse em fuga para o território donde tinha partido e onde, a coberto da fronteira, não podia mais ser perseguido.

Possuidor de rara coragem moral e grande espírito de decisão, procurando infiltrar-se à frente dos seus homens para atingir duramente o inimigo, só deixou de combater com a maior tenacidade quando, atingido mortalmente pelo fogo adver­sário, caiu inanimado, depois de ter incitado os seus subordinados ao cumprimento dos seus deveres para com a Pátria que tinha abraçado com o maior ardor desde a infância.
– Portaria de 10 de Dezembro de 1957 (Diário de Governo nº 251 / II Série / 1957)

Enfermeira Joana de Saúde Pires Tenório
[Guerra do Ultramar, Angola, 1961]

– Medalha de prata de Mérito Feminino – Pela Pátria

Med-Merito-Feminino
Considerando que Joana de Saúde Pires Tenório, Enfermeira nas minas do Mavoio, da Empresa do Cobre de Angola, exerceu notável acção em que muito contribuiu para manter o elevado moral do punhado de portugueses que tão nobre e valentemente asseguraram a defesa daquelas minas, posição chave nas faldas da Serra da Canda, concorrendo assim para a manutenção da soberania nacional naquela região; Considerando que em Março de  1961, quando da onda sanguinária do terrorismo avassalava a região do Mavoio, forçando a evacuação total de mulheres e crianças, ficou voluntariamente até que a região estivesse ocupada militarmente e pacificada, continuando a prestar a elementos do Exército a sua assistência técnica e moral;

Considerando ainda que, com risco da própria vida, demonstrou sempre, sobretudo nos momentos mais críticos, as suas extraordinárias qualidades de abnegação, heroísmo e sacrifício, a par de inexcedível calma, valentia e patriotismo, pelo que deve ser apontada como exemplo de portuguesa que nobremente serviu a Pátria:
Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro do Exército, condecorar com a Medalha de prata de Mérito Feminino – Pela Pátria, por se encontrar ao abrigo do nº 2 do artigo 2º, com referência ao artigo 3º do Decreto-Lei nº 44 566, de 12 de Setembro de 1962, a Enfermeira Joana de Saúde Pires Tenório.
– Portaria de 28 de Setembro de 1962 (Diário de Governo nº 255 / II Série / 1962)

 

 

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